Dedos percorriam as olheiras, verificando as mudanças que as semanas provocaram. Mais marcadas e profundas, eram resultado de um sono desregulado e uma mente cheia de perturbações. Pele pálida, barba por fazer. Olhos inexpressivos. Espelho refletindo alguém familiar, mas mais estranho a cada olhada.
Sádicas, as dúvidas mantinham ciclos alternados, incomodando quando a paz começava a se fazer presente. Quando a angustia amenizava e a vida do lado de fora da janela parecia feliz, cutucavam-no mantendo-o na cama. Luz apagada e fones no ouvido, jogava para longe qualquer vontade de lutar contra o estado de monotonia.
Carregavam memórias de beijos e sorrisos envelhecidas pelo tempo. De quando as mãos se juntavam e o corpo respondia com um arrepio na espinha, uma vontade de querer mais e mais perto. De quando elas, aquelas mãos, percorriam o coro cabeludo, o contorno das orelhas e os lábios em processo de mudança, implorando por mais um beijo.
As dúvidas substituíam as lembranças pela aflição do peito trincado. Pelas discussões repetitivas e frustrações acumuladas. A ausência frequente e as conversas cada vez mais frias. Arrepios agora consternados, liberavam fragmentos do que tinha sido intenso e importante.
Inconsciente e como autodefesa, protegidos sobre as mãos trêmulas, aqueles fragmentos aguardavam o dia em que seriam transformados em um belo mosaico.
Mesmo não ficando claro nos momentos de agonia, em algum ponto algo ou alguém surgiria para ajudar.